O homicído de Patrice Lumumba (série de 11 textos sobre a RDC) / Lumumba, Hammarskjöld, Kennedy e a CIA
A morte de uma nação - 19 sepulturas
Sem aviso prévio o meu pai levou a família num passeio desde a cidade capital de Kinshasa a uma área remota. Tinha na altura 6 anos. Após quilómetros feitos em longas horas de viagem entramos numa área rural onde o carro percorria trilhos sem asfalto e o capim passava o tejadilho. E foi no meio deste capim alto que nos tapava a visão que vi o meu pai abandonar o carro e correr. Sem entender a razão para tão brusca correria dentro daquele labirinto de capim segui-o com a mesma pressa, deixando a minha mãe para trás.
Sem aviso prévio o meu pai levou a família num passeio desde a cidade capital de Kinshasa a uma área remota. Tinha na altura 6 anos. Após quilómetros feitos em longas horas de viagem entramos numa área rural onde o carro percorria trilhos sem asfalto e o capim passava o tejadilho. E foi no meio deste capim alto que nos tapava a visão que vi o meu pai abandonar o carro e correr. Sem entender a razão para tão brusca correria dentro daquele labirinto de capim segui-o com a mesma pressa, deixando a minha mãe para trás.
A
sentir o corte da erva áspera na minha pele infantil, encontrei o meu pai ajoelhado e
chorando frente a três montes de terra. Sepulturas frente a uma casa antiga que
com as suas janelas e portas abertas parecia querer desabafar o que na mais
pequena divisão da casa teria acontecido. Percorremos todas as divisões completamente
despidas de provas e preenchidas de ecos de um passado de 5 anos. Mas com a
minha altura de uma criança nunca mais me esqueço da tela desenhada nos tectos
e paredes da casa de banho. Era uma mistura de salpicos com esguichos que o
tempo não apagara e nunca apagará. O sangue que manchou as paredes perdeu o vermelho e passou a ser da cor de terra. Mas até para uma criança inocente
era claro que aquele quarto escondia o ódio, a traição e a ganância que
encerrava o declínio de uma nação, a República Democrática do Congo.
E
mais tarde vim a saber que estava em Katanga na campa do meu avô. É nesta visão de regresso ao passado que um nacionalista congolês revê os homicídios que visavam terminar com as políticas governamentais levadas a cabo pelo único Primeiro Ministro eleito democraticamente na República Democrática do Congo – Patrice Lumumba.
Patrick Lumumba e Joseph Okito
Captura de Patrice Lumumba, Maurice Mpolo e Joseph Okito que são posteriormente torturados e mortos.
Notícias
de 14 de Fevereiro de 1961 assinadas por Paul Hofmann do New York Times
referiam tratar-se de um crime perpetrado pelas autoridades do Governo Provincial
de Katanga a mando do governo de Kinshasa (antiga Leopoldville). A versão inicial era de que se tratava de mais uma simples luta de africanos contra africanos. Avisos em tom de
ameaça foram lançados ao Presidente Moise Tshombe de Katanga pelo secretário geral das Nações
Unidas que lutavam contra os rebeldes e apoiavam o governo eleito de Patrice
Lumumba.
Coincidentemente 8 meses após a morte de Lumumba, Dag Hammarksjöld,
secretário Geral da ONU, morre num acidente de avião com mais 15 pessoas a 18
de setembro atribuindo-se à data as causas a erro do piloto.
Como
pontos de ligação nesta teia de mortes que num total perfazem 19 temos a
província de Katanga, o primeiro ministro Patrice Lumumba e o diplomata sueco Dag Hammarksjöld que apoiou
o envio de tropas para travar os rebeldes que se opunham ao governo eleito
democraticamente.
Passadas
mais de cinco décadas, ainda não se tem uma versão oficial de ambas as mortes embora
existam muitas teorias.
Dag Hammarksjöld e Presidente Moise Tshombe de Katanga
Mas
à medida que documentos oficiais vão sendo revelados confirmam-se as teses que o homicídio de
Lumumba teve um autor moral externo.
Dúvidas persistem no que se refere ao “acidente”
de Dag Hammarksjöld que o ex-presidente americano Harry Truman insistiu em
chamar de “Homicídio”. Segundo o mesmo numa entrevista ao New York Times “Dag
Hammarskjöld estava prestes a conseguir alguma coisa quando o mataram.”Levanta-se
a questão se ele havia descoberto que a CIA teria encomendado a morte de Patrice Lumumba?
Voltando
a Katanga é preciso relembrar que foi desta província que na década de 40 foi
retirado o urânio com a pureza essencial à confecção da Bomba Lançada sobre
Hiroshima. Esta região é ainda amaldiçoada com a existência de coltan, cobalto, cobre, rádio, urânio e diamantes. Talvez por
isso a província foi dividida em 2015 em 4 partes. Lubumbashi a segunda maior cidade
da RDC e a capital de Katanga é um hub
mineiro para muitas corporações que exportam para as grandes multinacionais.
Dado
este contexto regional percebe-se a tese defendida por Susan Williams em que a ONU e o Governo de Lumumba eram
tidos como uma ameaça aos interesses do lobby
de exploração do minério de Katanga que envolvia diferentes países: Bélgica, Reino
Unido, EUA, África do Sul e França.
As
visões humanistas e socialistas do diplomata sueco e do novo governo congolês
acabaram por fazê-los ser conotados como favoráveis ao comunismo soviético e
contra os interesses da minoria branca que controlava a exploração dos recursos
minerais.
Traçado
este guião geopolítico em plena guerra fria era previsível perceber-se que
África é um continente onde acidentes facilmente acontecem e continuarão a
acontecer.
Lueji Dharma, 26 de Novembro de 2018
Hubert Humphrey Fellow / MIT
Hubert Humphrey Fellow / MIT
Uma singela homenagem aos verdadeiros líderes africanos e do mundo.
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