CONGO III: Patrice Lumumba e a morte do prémio Nobel da Paz Dag Hammarskjöld

Oito meses após a morte de Patrice Lumumba a 17 de Janeiro de 1961, o secretário das Nações Unidas Dag Hammarskjöld morre num acidente de avião a 18 de Setembro. O acidente que acontece num trajecto entre o Congo e a Zâmbia levou à morte deste general sueco e de mais 15 passageiros e tripulantes. Conor O'Brien representante das Nações Unidas no Congo na altura declarou que ninguém a residir em Kinshasa acreditava na versão de acidente. O primeiro-ministro do Congo na altura -Cyrille Adoula - era da mesma opinião. Ele havia se encontrado com o secretário-geral Dag Hammarskjöld horas antes do "acidente" e em declarações ao Montreal Gazette de 1961 referiu:

"Quão ignóbil é este assassinato, não o primeiro deste tipo perpetrado pelos poderes endinheirados. O Sr. Hammarskjöld foi vítima de certos círculos financeiros para os quais uma vida humana não é igual a um grama de cobre ou urânio."

Destroços do avião de Dag Hammarskjöld numa floresta junto a Ndola.


Esta suspeita foi alicerçada logo no dia após o acidente pelo Presidente Truman que referiu ao New York Times que Hammarskjöld  “estava prestes a descobrir algo quando foi morto. Notem que referi quando ele foi morto". Suspeitava-se que Hammarskjöld ao lutar pela paz no Congo após a morte do Primeiro- Ministro Patrice Lumumba entrou em rota de colisão com os patrocinadores da independência da província de Katanga do Congo Belga. Não esqueçamos que 
Hammarskjöld   foi o criador da força militar das Nações Unidas - UNEF - com o objectivo de estabelecer a paz em zonas de conflito.

O contexto era o da guerra fria e da luta "anti-comunista" pelos minerais do Congo. Note-se que a União Soviética ganhava terreno no Congo e na exploração do urânio essencial às bombas atómicas. Muitos países lutavam por garantir o domínio destes recursos minerais e no terreno era sabido existirem agências como KGB, MI6 e a CIA ao serviço dos seus países. Relatórios e testemunhos de alguns agentes no terreno apontam para a existência de gravações classificadas destes serviços de inteligência que interceptaram as comunicações dos aviões nessa noite. Nestas gravações regista-se a presença de um outro avião que provocou o acidente ao contrário da versão inicial de erro acidental do piloto. Existem ainda os testemunhos de populares e soldados que garantem ter visto dois aviões no ar.
JFK e Dag Hammarskjöld 

A investigação a este acidente continua até à actualidade em que o Secretário das Nações Unidas é o português António Guterres. No ano de 2017 foi lhe entregue um relatório que atesta as evidências de que o acidente foi causado por uma outra aeronave. Neste relatório Mohamed Chande Othman traz revelações que apontam para a possibilidade de um atentado, como por exemplo, o testemunho de um sobrevivente do acidente - Sargento Harold Julien -  que referiu ter visto chamas no céu antes da queda. 
                                       
Aumentando esta biblioteca de evidências de atentado junta-se o fornecimento de 3 aviões pelo governo francês aos rebeldes de Katanga contra as recomendações do governo americano em Fevereiro de 1961. Altura em que o jovem político John F. Kennedy dava início ao seu mandato como 35º Presidente dos EUA.  A sua agenda referente à política externa era contrária à do Presidente Eisenhower (que o precedeu).  As políticas de Kennedy para África, à semelhança de Dag Hammarskjöld opunham-se ao pensamento colonial e visavam uma aproximação gradual aos líderes das nações recém-independentes da África. As acções de JKF apostavam na criação de "um terreno comum entre os ideais de nações de terceiro mundo recém-independentes e o interesse próprio americano em meio a uma guerra fria" e das corporações internacionais. Este terreno comum levou-o a ganhar a simpatia de líderes africanos como Kwame Nkrumah and Ahmed Sekou Toure.

JFK detinha uma grande admiração pelo general sueco Hammarskjöld que descreveu como "o maior estadista do século" mesmo tendo-se oposto à política das Nações Unidas perante o Congo. Esta visão comum de dois grandes decisores mundiais assustava as multinacionais e os separatistas de Katanga que viam uma possibilidade de perder o controlo da área mais rica do mundo. Na altura os maiores interessados na exploração do urânio e cobre do Congo para além dos belgas eram as multinacionais dos Rockefellers, Guggenheims and C. Douglas Dillon.

Hammarskjöld e Patrice Lumumba

Mesmo defendendo "a paz"  Hammarskjöld e Lumumba desentenderam-se na estratégia a adoptar para a retirada das tropas e mercenários belgas de Katanga. No entanto há registos da tristeza e sentimento de culpa de Hammarskjöld pelo homicídio de Lumumba. Como especialista na resolução do conflito armado no Congo cedo percebeu que esta morte prendia-se com a salvaguarda de interesses de países ocidentais e temia pelo povo congolês.  É no meio deste jogo de interesses que Dag Hammarskjöld planeou uma reunião para 18 de Setembro em Ndola na Zâmbia com o líder separatista de Katanga - Mose Tshombe; o encontro visava garantir a paz através do uso do exército das Nações unidas na retirada de tropas belgas e mercenários ao serviço de multinacionais do território de Katanga. No entanto, o seu avião não chegou a aterrar tendo se despenhado numa floresta perto da cidade de Ndola.

                             
                                                                 Hammarskjöld e Mose Tshombe

Segundo Lisa Peace para algumas forças incluindo a CIA,  o Secretário Geral das Nações Unidas - Dag Hammarskjold - era a última barreira para a tomada total do Congo. Para esta jornalista foi na Operação Celeste, com a senha "como está a Celeste nestes dias?" e agente de contacto Dwight que se planeou a queda do avião através de uma bomba que explodiria no momento da descolagem. Algo correu mal e o avião acabou por explodir no momento em que iniciava os procedimentos de aterragem.

Para memória recorda-se Hammarskjöld como um homem íntegro e diplomata nato que defendeu até à morte que as Nações Unidas deveriam servir como uma instituição de equilíbrio do poder entre as grandes potências e os restantes países. Foi o responsável pela criação do conceito de diplomacia silenciosa e das forças da paz.

Esta luta assente em valores de integridade espiritual, independência e justiça valeu-lhe a atribuição do Nobel da Paz em 1961. Esta nomeação havia sido feita antes da sua morte. No discurso de aceitação realizado por um compatriota seu este referiu que um dos livros que Dag levava era a Imitação de Cristo, de Thomas à Kempis onde colocara o juramento lido na tomada de posse como secretário-geral.

Das suas frases mais emblemáticas destaca-se :

"Nunca, em nome da paz e tranquilidade, negue as suas experiências e convicções"
"Por tudo o que passou. Obrigada.  E por tudo o que há de vir, SIM!"
― Dag Hammarskjold


Lueji Dharma

MIT H. HUMPHREY FELLOW 2013












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