Terrenos infraestruturados e a especulação imobiliária em Angola




É certo e sabido que o Estado Angolano tem investido avultadas somas na expansão das cidades de forma a garantir habitação e qualidade de vida aos seus cidadãos. Esta expansão passa necessariamente por um processo de infraestruturação que até à actualidade depende exclusivamente do sector público através dos mais diferenciados Ministérios e Gabinetes Técnicos e contratação pública de empreiteiros.

O referido investimento (vias, rede de abastecimento de água, rede de energia eléctrica, equipamentos públicos, etc) não tem sido recuperado para o Estado. Os privados obtiveram estes terrenos infraestruturados através de cedências gratuitas ou a valores irrisórios que não contemplavam o investimento do estado em infraestrutura. Muitas destas transacções baseavam-se, infelizmente, em tipos ilegais de práticas (tráficos de influência, nepotismo, corrupção, etc.). Sendo assim, a mais-valia do terreno destas áreas prime foi sendo transferida para os promotores imobiliários que lucravam com a venda dos terrenos (por vezes cedidos gratuitamente). Ao venderem  parcelas conseguiam financiar a construção e sem pressão de juros bancários ou impostos apresentavam valores de venda das habitações muito acima do mercado.

Esta situação é passível de ser observada no número de apartamentos vagos em quase todos os edifícios e condomínios recentes de Luanda. A concentração de lotes e prédios vagos na cidade de Luanda enquanto os proprietários mantêm-se à espera de uma maior valorização ou de um cliente “milagre” levam à contínua escassez de habitação apesar do imenso esforço do Estado na infraestruturação. Estas práticas levaram também a que o promotor preferisse especializar-se em vivendas de luxo entre muros ao invés de rentabilizar o terreno com construção vertical (oferecendo um maior número de habitações).

Esta situação torna-se um problema porque o investimento estatal acaba por servir apenas uma pequena franja da população mais abastada não resolvendo o problema da maioria. Onde poderiam viver 200 habitantes iremos encontrar, por vezes, apenas 10 famílias (20 a 30 hab/ha). A maior faixa demográfica encontra-se permanentemente encaixada em bairros sem acesso a infraestruturas ou em áreas periféricas, mantendo-se uma segregação urbana que mantém o ciclo de pobreza.

É este ciclo que não se pretende perpetuar a bem da economia e do tecido social. Por isso importa que o estado para manter o processo de expansão urbana garanta a recuperação do investimento através da comercialização dos terrenos com um valor de venda que incorpore uma baixa margem de lucro e os custos de infraestrutura.

O promotor imobiliário que pretenda adquirir os terrenos vê-se obrigado a estudar o seu projecto de acordo com as variáveis do mercado lançando produtos ajustados ao poder de aquisição dos compradores e com margens de lucro na ordem dos 20% a 30%. Por outro lado estes estudos que visam reduzir o risco constituem-se como produtos apelativos para a banca que viabilizará mais facilmente créditos imobiliários.



Cristina Câmara
Especialista em planeamento urbano e regional



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